quinta-feira, 28 de outubro de 2010

NANINHA




Pupila. Olhos de jabuticabas ardentes. Xortinho mariscado de pequenas lantejoulas. Ao som da luz vibrante Naninha se apresenta no palco do Rancho Fundo. Duas avezinhas de rapina lhe cheiram o intestino. Duas avezinhas de rapina, outras, espiam-lhe os passos. Tião Calado do fundo do palco vigia todo o salão. 
- Que belas nádegas... Fosse eu o sortudo de tão bela noite a seu lado, caso tivesse o tesouro que teve o rei Salomão... Ai, desgraça de vida... Tanta fartura em um lado e tanta miséria no outro.
Pezinhos de criança mimosa, doce gazela da Baixa. Uivo de lobos velhos famintos. Casa lotada. Bela Ivone, invejosa de natureza, tenta arrancar uma vaia, mas é sufocada pelos apupos e gritinhos dos gangrenados e irreverentes cristãos da baixada. 
- Fossem só aquelas nadegazinhas, mas a diaba tem um par de coxas... Chupava-lhe inteirinha... Eram duas garantidas!
Fosse-que-fosse, estava Naninha pronta. Açucena do meio-dia, flor linda da meia-noite, santa da baixaria, mãe nossa da putaria. Estava linda, resplandecente, pequena, bela, pérola valiosa, pequena avestruz-marinha, loba sofisticada do nosso lar.

(João Cândido Tessar in: Contos da Cidade Baixa)

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