MINHA DESCOBERTA de Augusto dos Anjos foi um dos acasos mais felizes da minha vida. A musicalidade, sonoridade, a superioridade de seus versos, tudo isto me causou forte impacto na adolescência. As pesquisas, então, que iniciei sobre o poeta lançaram-me num quadro absurdamente "horrível" da sua poesia. Seria, então e mesmo, Augusto dos Anjos poeta do horrível? No seu soneto "Minha Finalidade" parece confirmar:
Predeterminação imprescriptível/Oriunda da infra-astral Substância calma/plasmou, aparelhou, talhou minha alma/Para cantar de preferência o Horrível!
Mas, então, que "horrível" é este? A decomposição da carne depois da morte que revela a nossa composição orgânica frágil e, portanto, motivo de sua negação? A decomposição dos instintos pelo processo de socialização, de civilização? A decomposição de tudo que é forte pelo estabelecimento de tudo que é fraco? A decomposição da afirmação pela negação da vida? Então, em outro soneto pareço descobrir um dos processos de decomposição que dá significado, em parte, ao horrível a que estava predeterminado Augusto a cantar. Em seu soneto "Apóstrofe à carne", ele nos diz
Carne, feixe de mônadas bastardas./Conquanto em flâmeo fogo efêmero ardas,/A dardejar relampejantes brilhos./Dói-me ver, muito embora a alma te acenda, /Em tua podridão a herança horrenda, /Que eu tenho de deixar para os meus filhos!
Este HORRÍVEL que qualifica a poesia de Augusto dos Anjos não merece a assunção de um novo valor? Não é a hora, pois, de converter o horrível em BELO? Prossigamos!
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