Não é mais necessário fazer enxoval, nem atribuir ao sexo (genital) as cores do amor. Parece que, de repente, na cabeça da dona de casa, bem como, na cabeça da executiva da multinacional a ficha caiu: "meu filho nascerá sem gênero". Com isto, a dona de casa e o pai de família evitam depressões pós-primeira-infância: o macho ali pretendido nos braços do pai pode não ser o esperado. De repente, aquele pênis ali pendurado entre as pernas entre-abertas da criaturinha não significa nada a não ser a vontade de um desejo paterno, materno, familiar. O último GOLPE, pois, do desencantamento do mundo se dá pelo desencantamento de gênero: a biologia não nos serve mais como parâmetro, como paradigma de gênero. A cueca comprada com tanto amor pode ser o princípio da ingerência parterna: o meninão tão desejado pode, na verdade, desejar é uma calcinha bem cavadinha, com lacinho na frente e rendinha atrás. Seu nome, um daqueles nomes de guerreiro hollywoodiano pode não combinar, então, ser necessária a troca por um nome mais a caráter: Nikite Coktail, Pâmella Johnson, etc. Há algo de trágico e heróico nas travestis: um destino outorgado (a masculinidade) X um destino concebido, desejado, amado (a feminilidade). Não, não há dubiedade na travesti: ela é uma mulher. Assim se apresenta, assim quer ser desejada, a sua "transformação" é a sua carta de alforria e o cartão de visita da posteridade. A travesti, pois, vive a sua agonia (disputa) no grande teatro da vida humana: a sociedade; também a sua glória: a fase heróica de ter desafiado os cânones da "natureza" e tê-los, todos, vencidos. A travesti desafia a biologia, vence este duelo. Ela refaz a anatomia e a fisiologia: desarruma o edifício social do gênero, inverte os valores biológicos da vida, os valores sociais do gênero, os valores filosóficos do ser, os valores religiosos da criação. A travesti desestrutura o conhecido, reforma com os escombros os elementos antigos dando-lhe uma paisagem toda nova. Quando, então, somos capazes de NEGAR a biologia (determinação) o que aparece não é o duplo (macho e fêmea), a dúvida (será que é isto ou aquilo), a dubiedade (a contradição), a incerteza pós-moderna da modernidade.O que se nos apresenta é a liberdade da escolha, de que práticas quero praticar, que elementos quero que faça parte de mim. Algo parecido como um super-mercado (simbólico) social: você entra e pega isto e aquilo e vive sem ser visto e crido que é esse algo eternamente, porque o eterno é uma fantasia esquizofrênica dos biólogos, dos religiosos e dos leigos. Tenho dito!!!
Nenhum comentário:
Postar um comentário