A pegação nasceu do detrito, literalmente, em meio à merda; hoje, pegação virou febre nacional e tem o seu sujeito qualificado: o pegador. Uma mocinha hoje em dia deseja um homem que tenha "pegada" - delira por um boyzinho de zorba e armado até os dentes -. A pegação nasceu dos gays, das bichas, - deste submundo pútrido! -, que saíam de banheiro em banheiro - público vale ressaltar, mas também privados! - à procura do seu maná - ai, o flaneur! -. Hoje não, hoje pegação virou febre, foi introduzida no mundo dos normais que lhe retiraram a catinga de merda e no lugar fluidificaram-no com sabonete líquido senador. E eis, pois, que das zonas pútridas, da boca do lixão surge a febre da moda atual: estariam, pois, os heterossexuais virando bichas ou as bichas heterossexuais? Qualquer menininha que abandonou as bonecas deseja agora um homenzinho jurássico, aquele que tenha "pegada", que jogue a moleca na parede, que lhe chame de "putinha", que arranque sua tanguinha no dente e depois a cuspa fora. É o triunfo das bichas, daquelas bichas passivas do lixão sexual, as doentes dos nervos, as medicalizadas, as nevrálgicas, aquelas que recebiam testículos de macacos e tratamento de eletrochoques, convulsoterapia para adquirirem a virilidade 'natural' que lhes faltava. A pegação agora é a regra, o pegador é a marca da zona: a zona é o inalcançável atingível. São os valores antigos sendo implodidos: é a marca da inversão. O pegador é aquele super-herói que demonstra pra o amigo como deve chegar n@ gatinh@. O pegador muito se assemelha com o sedutor diferenciando-se apenas num quesito muito importante: a verdade. Para a prática da pegação toda a verdade está suspensa, no limite, extinta. Na arte da sedução o sedutor tem de desdobrar-se, inventar centenas de estrategemas para conseguir o seu intento: a sedução é o jogo da sabedoria que se esconde e se revela, é o lusco-fusco da verdade. Na pegação tudo é claro, nada a esconder, os estratagemas foram banidos. O sedutor 'ganha' @ garot@ pelo "papo fino, cheio de imagens ideais", o pegador faz o ideal acontecer realmente: é o seu corpo talhado, é a sua virilidade exposta em praça pública, é o seu toque, o seu cheiro, a sua fala mais que melíflua. Na pegação há a falta, a falta de promessa: a vida corre pelos segundos e um "não" pode significar nunca mais'. Na sedução o trabalho é lento, é tradicional, é cíclico, procura-se as profundidades inabitáveis, mas que se revelam ser apenas superficialidades bem disfarçadas. Pois, nascida dos banheiros públicos, fedendo a mijo e a merda, a pegação hoje habita as baladas mais cheirosas, caricatas e ricas. A pegação saiu dos banheiros e ganhou os palcos da televisão; entrou nas telenovelas e virou o ideal dos malandrinhos pequeno-burgueses que nada tendo a fazer num sábado à noite correm para uma masturbação em conjunto numa zona qualquer. A avozinha hoje pergunta naturalmente para sua netinha: "Oh, filhinha, você vai pra balada hoje?" e esta lhe sorrir sem enrubescer, sem alvoroço e lhe responde que vai 'pegar' quantos puder. O beijo é só um beijo; a boca é mais uma boca; o corpo talhado, suado, super-aquecido, fervido da balada, da pegação é só mais um e, rapidamente, será esquecido ao suave toque num outro corpo, ao sabor de um outro beijo, ao fim, será esquecido diante de uma pegada mais forte, mais generosa, mais CAVALAR, menos propedêutica e mais de abalar. Pois é, neste caso, a pegação inverte e triunfa sobre os valores antigos: faz o pegador comer aquilo que só teria direito após o matrimônio: a xaninha da mocinha ou cuzinho do rapazola. Faz d@ mocinh@ impúbere senhor@ do seu destino, dá-lhe a oportunidade de escolher e devolve ao fisiologismo sexual a sua autoridade de ofício. Na pegação, evidente, há os retardatários, os ressentidos, aqueles que não conseguem pegar ninguém que começam a inventar um discurso de reação. Mas estes, pelo visto, não conseguem grandes feitos... Como se canta nas baladas pelo mundo, aquilo que passeia em todas as cabeças: "Tá dominado, tá tudo dominado". O pegador venceu o ficante que com o seu fantasma obsessivo ( o amor!) a lhe assombrar interrompe a sua liberação total, porque há no ficante um resíduo, uma memória da tradição, um porvir, ainda um esperar. Enquanto não consigo pegar ninguém por pura incompetência restou-me apenas refletir sobre tudo isto. INFERNOS!!!!! Tenho dito!
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