Piaba é um negrinho sestroso. Gaba-se pela cidade baixa de ser pauzudo. Mimosa Gardenal diz que é tudo mentira.
- Este aí não me mete o menor medo!
À noite, quando aparecem os leões-marinhos, os lobos e as jaguatiricas, esta assembléia das moneras, vem também juntar-se Piaba, doudo negrinho enviesado, de corpo quente, de sangue tinindo na jugular.
- Quero quenga especial.
O riso bruxuleante de Monique acende fácil na cara acizentada do negrinho. Os desejos da paixão. Fingisse ser o imperador Heliogabalo deixava correr-se como o reizinho que desejava possuído, ponderava ao canto da mesa Monique.
- Mais gostosinho que Jerônimo, ah, é sim... Dá até viradeira nas tripas e tremedeira no coração. Se me quisesse, virava freira pra ser só dele.
Lá do seu canto o negrinho espia Monique que lhe espia também. Duas borboletinhas da noite. Dois moscões que reviram a carnificina da baixada e espalham o cheiro pútrido da depravação.
- Não é assim não siá dona. Pouca puta! - ouve-se apenas um reclamar de voz masculina.
Fosso úmido das gazelas, eis, pois. Ao fundo do Rancho surge Simone Pé de Anjo. Gargalhadas tristes, um palavrão se destaca:
- Caralho... Caralho para todo mundo! - gargalhadas.
Madrugada já do 2 de novembro. Nas janelas de algumas casas da baixa beijam flores os beija-flores, os colibris; as açucenas e camélias, os pirilampos ainda esvoaçam iluminando pontos aqui e ali. Na sacada de um casarão muito antigo sob a luz de um poste muito alto vê-se Monique e Piaba no afago acasalador e tenebroso das mariposas.
(João Cândido Tessar in: Contos da Cidade Baixa)
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