Carregava na alma duas grandes e grossas correntes. Como no gato malvado, o antigo guizo. Bastava-lhe tão somente apontar lá do alto da Ladeira da Borborema, pronto, toda a baixa já lhe advinhava o instinto. Era Simone Pé de Anjo.
- Simone Pé de Anjo é uma vaca!
Magra sinuosa, demônia que habitava em sonhos profundos, estranha natureza, inteligência incompreensível naquele lupanar. Doce abelhinha esvoaçante, casinhas dorminhocas da Ladeira.
- Vaquinha dos meus desejos...
Cai Simone Pé de Anjo na ladeira e embola até a metade. Rápido a turba embriagada reage a gargalhadas. É Simone que parece estranha, louca pelas calçadas, jaguatirica sensual, passos melífluos, olhos de cigana, malandra, acende um cigarro, faz pose de quem quer... Desnuda-se, gargalha, faz uma performance.
- Que peitinhos amaneirados!
- São belas as suas nádegas, por mim, deixava-me descansar noite inteirinha.
Abelhinha furiosa, mas domada por uma força oculta. Cabeça de lado, de pé, longos cabelos. Gemidos, novamente, gargalhadas, gemidos, de repente, cai fogosa ainda com a mão na florzinha querendo ainda mais arrancar um pouco do pólen. Exausta, é carregada por Doca Juru e Tião Calado, estes Don Juan da baixada. Simone Pé de Anjo apagada.
(João Cândido Tessar in: Contos da Cidade Baixa)
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